Ano 2006
Rescaldo das Presidenciais – E agora Manuel Alegre?
Em democracia ganha quem tem mais votos e, nesse sentido, há que democraticamente, aceitar a decisão dos cidadãos eleitores e endereçar os parabéns a Cavaco Silva que, contra as minhas expectativas, conseguiu vencer as eleições presidenciais a uma só volta.
De nada adianta falar que o maior candidato foi a abstenção que teve uma maioria absolutíssima.
Na verdade nenhum candidato se aproximou dos quase três milhões e meio de votos que seriam suficientes para uma maioria esmagadora.
Em democracia contam os votos válidos e, nessa contagem, Cavaco Silva teve a maioria absoluta.
Os resultados não foram favoráveis a Mário Soares. Um conjunto da factores adversos impediram que aquele que foi, na minha opinião, o melhor candidato não tivesse passado à segunda volta e aí ter vencido o candidato apoiado pela direita.
Alguns factores que impediram a vitória de Soares encontraram-se no inteiro do Partido Socialista, principalmente o comportamento de Manuel Alegre e dalguns militantes, tidos por notáveis, que decidiram apoiá-lo, criando uma enorme confusão no eleitorado socialista.
Manuel Alegre teve a sua oportunidade para se vingar de José Sócrates e fê-lo da pior maneira. Foi eleito deputado integrado nas listas do Partido Socialista. Aliás, fez toda a sua carreira integrado nas listas do PS. Não creio que tenha legitimidade para se arrogar do estatuto que parece pretender.
Manuel Alegre afastou-se da solidariedade devida ao governo do seu partido e, como que por milagre, parece que nada tinha a ver com o PS. A época mostrou-se propícia porque o governo tomou um conjunto de medidas muito difíceis e a demarcação foi uma tentação a que Manuel Alegre não resistiu.
Habituado a um discurso de esquerda e um comportamento de direita, não hesitou em ser, mais uma vez, um grande aliado da direita. Não foi por acaso que foi fortemente elogiado por pessoas de direita que viram uma grande oportunidade de infligir, por essa via, uma derrota a Mário Soares.
E agora? Vai formar um novo partido, tal como Ramalho Eanes? Ou irá formar um grupo de cidadãos do tipo movimento cívico ou anti-partidos?
Estas possibilidades não deixam de ser curiosas por serem protagonizadas por uma pessoa que fez todo o seu trajecto político integrado no PS que agora combate, como curioso é o atestado médico apresentado na Assembleia da República, de doença, enquanto reúne com os seus apoiantes para decidir o que vai fazer com a percentagem de votos que se esfuma no dia das eleições.
Tem o seu momento de glória efémera e rapidamente passará ao esquecimento, enquanto o Partido Socialista se recomporá deste desaire e voltará a encontrar os caminhos que lhe deram a vitória no início deste ano.
Mário Soares não ganhou. Na minha opinião foi Portugal que perdeu por isso. Iria ter um presidente de grande prestígio internacional e que muito ajudaria o nosso país.
Mário Soares nada tinha a ganhar e, apesar disso, mostrou-se disponível para trabalhar pelo nosso país. Nem qualquer um faria isso. Só mesmo Mário Soares. Com a sua dimensão, é capaz de apostar tudo o que acumulou no passado e arriscar-se a perder tudo.
Esta atitude de Mário Soares veio, do meu ponto de vista, engrandecê-lo ainda mais. Outro qualquer no seu lugar teria sido muito mais calculista e menos generoso. Não arriscaria o que Mário Soares arriscou. Teria receio de perder e ninguém poderia condená-lo por isso.
Mas Mário Soares não funciona assim. A sua dimensão de Homem de Estado e de político não lhe permitem acomodar-se aos louros colhidos ao longo da vida. Manifesta uma permanente disponibilidade e trabalhará até morrer.
Será difícil de igualar a sua longevidade física e intelectual.
Se eu admirava Soares, passei a admirá-lo ainda mais.
Resta desejar que Cavaco Silva tenha um bom mandato para bem de Portugal e dos portugueses.
Afonso Paixão
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