Trofa
Paulino Macedo: “No Covid-19, o objetivo era não deixar ficar ninguém para trás. E não ficou”
“Nós entramos na cozinha, nos quartos, em escritórios todo mobilados, mas também entramos em corredores, em que os alunos estavam no chão com o computador à frente.”
Com 35 anos de experiência como gestor educativo, Paulino Macedo prepara-se para abraçar a nova fase da vida, na aposentação. Em entrevista ao NT e à TrofaTv, o professor de Moral e diretor que marcou gerações de alunos na cidade da Trofa falou dos momentos que marcaram a carreira profissional, que passou pela criação dos agrupamentos de escolas, pelo encerramento de estabelecimentos, pela remodelação do parque escolar e pela pandemia de Covid-19.
(2.ª parte da entrevista)
JA: No meio disto tudo, ainda apanhou com a pandemia de Covid-19, que veio transfigurar toda a organização pedagógica e o normal funcionamento das escolas.
PM: O Covid-19 é um acontecimento que me vai deixar marcas para toda a vida. Eu sou daqueles que estimulava para fazer testes e mais testes. Fazíamos filas, algumas iam até lá fora. No Agrupamento, do ponto de vista da utilização das tecnologias, estávamos preparados para isso. Que eu saiba, éramos das poucas escolas que já utilizava o (programa informático) Teams para comunicar com as pessoas. Na interrupção do Carnaval, montei uma escola diferente, com Sharepoint, Office365, o e-mail institucional e grupos de distribuição de correio eletrónico. Fiz uma reunião geral de professores e de assistentes operacionais para apresentar o novo plano, em formato online, em que participaram mais de 300 pessoas. Uma coisa do outro mundo. Fiz os horários dos alunos. Dias depois, havia duas ou três turmas do 1.º ciclo, cujos professores tinham um pouco mais de dificuldades, fui eu e a equipa que trabalhava comigo, na altura o professor Domingos, ensiná-los a trabalhar com a plataforma. A meio da segunda semana de aulas à distância, percebemos que havia meia dúzia de alunos, em Cedões, que não apareciam. Solicitamos apoio à Polícia Municipal e percebemos que os alunos não tinham condições técnicas e estabelecemos um acordo, de virem à escola buscar testes e de entregá-los passados alguns dias. Do ponto de vista da organização, eu tinha o objetivo de não deixar ficar ninguém para trás. E não ficou. Eu desmontei salas de computadores para cedê-los aos alunos que não tinham. Havia uma recomendação aos professores de que, se se apercebessem que havia algum aluno que durante o dia não aparecia, teriam de comunicar à direção. A professora Raquel tomava conta do 1.º ciclo, a professora Luísa tomava conta do Ensino Secundário e professor Mário tomava conta do ensino profissional. Eu ligava-me ao computador às 08h00 e só saía às 18h30, quando sabia que tudo tinha terminado. E de vez em quando, aparecia nas aulas.
JA: O processo organizacional acabou por ser positivo, mas e do ponto de vista pedagógico, de assimilação de conteúdos?
PM: Do ponto de vista da organização e de não deixar ninguém para trás, foi uma experiência interessante, mas do ponto de vista da aprendizagem esqueçam. Não vale a pena estarmos a enganar-nos. Aqueles que eram bons alunos, continuaram a ser, mas aqueles que precisavam de um acompanhamento, que precisavam que o professor puxasse por eles, não conseguiram. Depois, entramos por dentro das casas das pessoas. Nós entramos na cozinha, nos quartos, em escritórios todo mobilados, mas também entramos em corredores, em que os alunos estavam no chão com o computador à frente. Este período deu para perceber que o ensino presencial é fundamental. Depois, quanto à recuperação das aprendizagens, ainda estamos a sofrer com isso. Ainda há muitas lacunas e a maior está na convivialidade dos alunos. Eles chegaram à escola e não sabiam conviver, vinham irritados e qualquer coisa os fazia ficar nervosos. Agora, já começam a acalmar.
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