Edição 512
Para quem governam os nossos eleitos?
Desde a sua criação, o concelho da Trofa teve 3 presidentes de câmara: Bernardino Vasconcelos, que governou entre 2001 e 2009, foi acusado em 2013 pelo DCIAP pela prática de 8 crimes de falsificação agravada e 8 crimes de abuso de poder. Joana Lima, que governou entre 2009 e 2013, enfrenta agora uma acusação do Ministério Público pela prática de 2 crimes de abuso de poder e 1 de participação económica em negócio. Sérgio Humberto governa desde o final de 2013 e, apesar de não pender sobre ele qualquer suspeita concreta, recentes ajustes directos são passíveis de levantar dúvidas quanto ao seu enquadramento legal. Importa aqui reter que o histórico local é preocupante.
Igualmente preocupante é a forma como muitos destes casos emergem à superfície. O panfletismo e as denúncias anónimas de carácter político-partidário, típicos de períodos pré-eleitorais como aquele que agora inicia, são a expressão de uma forma vil, rasteira e vergonhosa de fazer política, abundantemente usada por muitos daqueles que enchem o peito para acusar terceiros. E mesmo quando nada há a dizer sobre A ou B, inventam-se boatos, vasculham-se vidas privadas ou lançam-se ataques ad hominem, a arma dos ignóbeis e dos biscateiros sem carácter. Desprezível.
Voltando à anterior autarca, as acusações de abuso de poder dizem respeito a 2 situações que, a serem confirmadas, configuram a prática de nepotismo. Num deles, e segundo o página web da Procuradoria-Geral Distrital do Porto, Joana Lima terá entregue todo o fornecimento de flores do município para eventos e dias festivos à sua irmã, num valor total que, segundo consta, rondará os 4 mil euros. No outro, a socialista terá escolhido a oficina do companheiro de uma sua sobrinha para entregar todas as reparações e revisões da frota automóvel do município, num valor que terá ascendido a aproximadamente 60 mil euros. Finalmente, a acusação de participação económica em negócio diz respeito à concessão do bar contíguo ao Aquaplace, entre o final de 2010 e Abril de 2012, sem que qualquer renda ou despesa com electricidade, água ou gás tenha sido paga pelo arrendatário.
Algumas vozes saíram em defesa da ex-autarca referindo tratarem-se de valores residuais. Mas, na minha opinião, o cerne da questão não reside tanto o valor em si mas na forma como estes serviços foram entregues. Torna-se particularmente contraditório que alguém, em tempos heroicamente apelidada de “Mulher do Povo”, tenha assumido um critério de selecção opaco, através do qual alguns dos seus familiares parecem ter gozado de privilégios inacessíveis ao comum dos mortais. É que na Trofa existem mais oficinas e floristas que precisam, algumas desesperadamente, de negócio que os impeça de se juntaram a interminável lista de falências que se vai avolumando neste país.
Ajustes directos, clientelismo, interesses partidários, negócios opacos, manipulação de informação, derrapagens, favorecimentos, intrigas e irresponsabilidade são termos e expressões que surgem vezes demais associados às pessoas que elegemos para nos representar. O denominador comum entre estas variáveis chama-se bloco central, uma estrutura não-oficial em torno da qual gravitam interesses económicos que, regra geral, se sobrepõem à lógica de serviço público que supostamente deveria imperar e da qual toda uma nação vive refém. Afinal de contas, para quem governam os nossos eleitos?
“O autor escreve ao abrigo da língua portuguesa que aprendeu na escola”
João Mendes
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