Edição 496
O radicalismo que ameaça a Europa
Fruto de permanentes escândalos de corrupção e diferentes outras formas de fraude, cresce na sociedade portuguesa e europeia em geral, um perigoso sentimento de aversão aos partidos políticos, com destaque para aqueles que compõem o arco da governação. Freeport, BPN, Portucale, submarinos, derrapagens sucessivas ou contratos de PPP’s caracterizados por governantes que assinam péssimos negócios para o Estado mas altamente lucrativos para empresas para as quais transitam após o seu mandato governativo são apenas alguns exemplos com o mesmo denominador comum: existe sempre um atual ou antigo governante do PS, PSD ou CDS envolvido. Sempre.
A percepção destes esquemas pelo grande público, amplificada pela crescente velocidade com que a informação circula atualmente, está a causar danos irreparáveis nos partidos ditos moderados por essa Europa fora, que têm vindo a perder eleitorado, eleição após eleição. Paralelamente, assiste-se ao crescimento da extrema-direita em estados como a França (FN) ou Reino Unido (UKIP), e da extrema-esquerda em países como a Grécia (Syriza) ou a Espanha (Podemos). Sondagens recentes indicam mesmo que a Frente Nacional e o Podemos são sérios candidatos a ganhar as próximas Legislativas nos seus países. Apesar da distância ideológica que os separa, todos estes partidos têm pelo menos duas bandeiras comuns que lhes garantem centenas de milhares de votos: são críticos ferozes da corrupção e opositores do projeto europeu.
Perante estas movimentações no xadrez político europeu, seria expectável uma mudança radical de atitude por parte dos partidos do centro, não só numa lógica de manutenção do poder, essencial para a sua coesão, mas também pelo imperativo ético de reforçar a democracia, princípio basilar cada vez mais em causa pela ascensão dos extremistas, aqui com destaque para a extrema-direita cujo discurso é mais violento e persecutório, sendo que a questão da emigração é talvez a mais preocupante. A possibilidade destas forças ocuparem o poder em estados-chave no seio da UE é um risco real cujos danos poderão estilhaçar por completo tudo aquilo que foi feito até aqui. Mas essa mudança não está a acontecer.
Os fantasmas do passado espreitam ao virar da esquina. Numa Europa que sofreu duas guerras devastadoras no último século, onde totalitarismos de esquerda e direita quase estrangularam toda e qualquer aspiração a uma sociedade aberta, plural e democrática, talvez tenha chegado a hora dos partidos moderados tomarem uma posição, sob pena de serem submetidos a uma pasokização (termo usado para descrever a queda de partidos moderados, inspirado na razia eleitoral sofrida pelos socialistas/sociais-democratas do PASOK, tradicional partido de governo grego que nas últimas Legislativas viu a sua representação parlamentar cair de 160 para 41 deputados), abrindo espaço a correntes mais radicais que ameaçam desintegrar uma Europa dilacerada pela crise financeira, pelo vazio de representatividade e, sobretudo, por uma preocupante crise de valores. É urgente que quem milita nestes partidos tome consciência desta realidade antes que seja tarde demais. Mas não é menos urgente que os europeus no geral deixem de se preocupar tanto com questões secundárias como o futebol ou os reality shows e façam a sua parte. A atual situação política da Europa é um convite ao radicalismo. Alguém quer voltar ao tempo dos partidos únicos?
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