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Edição 723

Nem a pandemia apagará a grandeza da festa de Senhora das Dores

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Uma relíquia dos nossos tempos, que será afetada por uma pandemia que marcará, inevitavelmente, o século XXI. Apesar das grandes restrições que a romaria de Nossa Senhora das Dores sofrerá este ano, sem programa lúdico nem a majestosa procissão que atrai milhares de pessoas à cidade, o NT faz questão de assinalar a efeméride, contando, para isso, com o excelente contributo da História.

“Muitos comboios cheios de romeiros e o mesmo de outras localidades distantes; além de trens particulares, cavalgaduras e ranchos que vêm de diferentes partes”. Foi assim que Napoleão Sousa Marques escreveu sobre como era a chegada das pessoas à Trofa, para participar na romaria de Nossa Senhora das Dores.

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Através da obra “Roteiro Turístico-cultural da Cidade da Trofa”, é possível fazer-se uma viagem no tempo de algumas décadas, para ver como os romeiros se integravam na festa, muitos deles munidos de “cestos, malas e trouxas com os componentes merendeiros”, outros tantos com alimento cultural, que é o mesmo que dizer acompanhados de “violas, rebecas, clarinetes” e “bombos”, que “tangem, em todo o caminho e no arraial, dançando homens e mulheres, ao som destes instrumentos”.

O arraial era caracterizado como “vasto” e “lindíssimo”, onde havia “muitas barracas com vinhos e comidas, doces e outros géneros” e tudo desaparecia rápido, “apesar de farnéis bem recheados”.

Já naquele tempo a procissão, “com seis andores”, realizava-se “depois da festa da igreja”. Os gigantes, carregados pela força de “vinte homens”, eram o “luxo destas terras”, abençoadas pelos “muitos anjinhos, vestidos com grande magnificência, e carregados de grossos cordões de ouro, em tanta quantidade e de tão grande peso, que as pobres crianças vão ajoujadas”.

Virando para o caminho da fé, a Capela Nossa Senhora das Dores foi, e é, por estes dias, o chamariz das festas. Com mais de 250 anos de existência, a ermida abre o livro das angústias, dores e tristezas por que terá passado a Virgem Maria durante a sua vida, desde o nascimento até à morte do seu Filho, Jesus.

Estas “dores” (ver caixa), na forma de sete espadas que trespassam o seu coração imaculado, estão representadas na capela-mor, seis em azulejos e a sétima na imagem que está na tribuna central.

Em 1766, a paróquia de S. Martinho de Bougado estava sob a jurisdição da diocese do Porto e tinha como responsável pastoral o padre Alberto Inácio Pimentel.

Segundo as “Memórias Paroquiais do Arquivo Nacional da Torre do Tombo”, a freguesia (paróquia) está dividida em vários lugares. “Esta tem 112 vizinhos e pessoas entre maiores e menores são 398”. Tem o lugar de São Martinho (padroeiro) assim como outros situados em planície, “que vai da ponte da Lagoncinha para o Porto por quase meia légua”… “sendo-lhe de divisa o Rio Ave (…) Faz a festa do padroeiro São Martinho (10 e 11 de Novembro) e a Festa do Espírito Santo e suas oitavas…”

Até este ano de 1766, não há referência alguma à devoção (ou festa) de Nossa Senhora das Dores por parte do povo da freguesia (paróquia), o que só aconteceu a partir do dia 16 de agosto de 1766, data em que o abade de então, Inácio Pimentel, fervoroso devoto de Nossa Senhora das Dores, juntamente com alguns dos seus paroquianos, dirigiu um pedido ao bispo da diocese para ser erigida uma ermida em honra de Nossa Senhora das Dores.

S. Martinho de Bougado era uma freguesia de reduzida população, que tinha dificuldades em realizar uma festa com relativa grandeza. Mesmo assim, com sacrifício, no terceiro domingo do mês de agosto era realizada a festa no monte da Capela. A comissão era constituída por um juiz, um tesoureiro, dois procuradores e quarenta mordomos, os quais deitaram mãos à obra, ou então como se dizia, realizaram a “função de Nossa Senhora das Dores”.

A comissão era constituída pelos chefes de família de toda a freguesia, porque cada aldeia não tinha, como agora, pessoas com número suficiente para a realização das festas.

AS SETE DORES DA VIRGEM

1.ª Dor: Profecia do Velho Simeão: “Uma espada trespassará a tua alma”.
2.ª Dor: Fuga para Egipto: “Levanta-te (José), toma o Menino e Sua mãe e foge para o Egipto”.
3.ª Dor: Perda do Menino Jesus no Templo: “Filho, por que procedeste assim connosco? Eis que teu pai e eu te procurávamos, cheios de aflição”.
4.ª Dor: Maria encontra Jesus a caminho do Calvário.
5.ª Dor: Jesus morre na Cruz – Junto da Cruz de Jesus estavam de pé Maria, Sua mãe, Maria, mulher de Cléofas, e Maria Madalena.
6.ª Dor: Maria recebe o corpo de Jesus em seus braços: José de Arimateia tirou o corpo de Jesus da Cruz e envolveu-O num lençol de linho e entrega-O a Maria.
7.ª Dor: O corpo de Jesus é sepultado no túmulo. Maria fica sem seu Filho, nem vivo nem morto. É a imagem principal da Capela no centro do altar-mor. (Jesus está morto no sepulcro).

“Ninguém basta para imaginar os fogos do divino amor e saudades que a Virgem padecia depois da Ascensão do Senhor; e porventura visitava muitas vezes o lugar da Paixão e sepultura de seu Filho. O amor de Cristo ardia no peito da Virgem. Com as saudades que tinha do Senhor juntava lágrimas amorosas sem conta e viver tanto tempo sem o seu amado, causava nela uma maneira de martírio. Clamava no mais vivo do coração e dizia: “Quando darão vau os rios caudalosos de minhas lágrimas? Quando virá este, quando?”

Viveu a Virgem no monte de Sião até à sua Assunção, ouvia missa cada dia e comungava da mão de São João. Consolava os peregrinos que a vinham visitar, com palavras suavíssimas.

Ficou a Mãe de Deus neste mundo para que a Igreja gozasse de consolação visível. Dizem que presidia nas conferências e disputas que se ofereciam nas coisas de fé, declarando as dúvidas que ocorriam e confortando mais aqueles entendimentos que pelo Espírito Santo já estavam alumiados.

Chegada pois a hora, em que esta Senhora havia de passar desta vida e vir alegrar com sua presença os moradores do Céu e triunfar da tirania da morte e corrupção da carne, foi suma a sua alegria, porque havia de ver o Cristo em sua glória e formosura. Esta hora lhe foi revelada pelo Anjo Gabriel”.

D. Frei Amador Arrais,
bispo Carmelita

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