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Memórias e Histórias da Trofa: O Manuel d’Oliveira Azevedo – “O Carqueja” (1)

Os problemas do “Carqueja” iam começar naquele momento. A filha entrava no comboio, mas, não regressava à Trofa. Alegadamente, tinha tomado sumiço e ninguém aqui no burgo a tinha recebido e soaram os alarmes para um possível desaparecimento.

José Pedro Reis

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A história é como as cerejas, pesquisamos por um assunto e de forma inadvertida surge um outro tema, e outro, e outro… Desta vez, aconteceu algo semelhante. Estando na Torre do Tombo nas habituais pesquisas em temas relacionados com a polícia e a segurança, eis que, no meio daquelas enormes pilhas de documentos referentes aos vários fundos do Governo Civil de Lisboa, surge a referência a S. Tiago, ou como escreveu o elemento do Ministério Público, “S. Teago” de Bougado.

A curiosidade é a maior aliada de um historiador e, com naturalidade, começou a leitura dos documentos, que se tratavam, num primeiro momento, de um indivíduo de nome “Manuel de Oliveira Azevedo”, conhecido popularmente como o “Carqueja”, natural de Santiago de Bougado, que supostamente tinha feito desaparecer a sua filha Emília, de 12 anos, alegando durante a indagação por respostas para as causas de desaparecimento, que tendo ido, em 18 de fevereiro, para Lisboa, onde se empregou na venda de carnes verdes aos domicílios, levando consigo a sua referida filha.

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No momento desta inquirição, estávamos em maio de 1922, ou seja, pouco mais de dois meses tinham passado da sua ida para Lisboa, rapidamente tinha percebido que não tinha condições de sobrevivência para os dois na capital e a filha regressava ao norte, possivelmente, para junto de algum familiar.

Os problemas do “Carqueja” iam começar naquele momento. A filha entrava no comboio, mas, não regressava à Trofa. Alegadamente, tinha tomado sumiço e ninguém aqui no burgo a tinha recebido e soaram os alarmes para um possível desaparecimento.

Ele alegava que tinha colocado a filha no comboio, que tinha partido de Lisboa às 18h e 50 minutos do dia 3 ou 4 de março, da Estação do Rossio, mas com a particularidade de a ter ocultado sob um banco de uma carruagem e recomenda-lhe que ali se conservasse até à chegada do comboio ao Porto.

O Ministério Público alegava uma possível teoria em que a sua filha tinha sido descoberta seguramente pelo revisor durante a viagem e tinha sido abandonada numa das estações, porque viajava sem bilhete e também sem dinheiro para comprar esse título de ingresso. O desaparecimento provocado pelo “nosso” homem poderia também na prática nada ter haver com ele.

A situação do Manuel Azevedo era mais complexa do que se julga, isto porque ele tinha longo percurso criminal e era um suspeito crónico das autoridades. Já tinha cumprido pena de degredo em Luanda, tinha sido preso pouco tempo antes de embarcar para Lisboa, no Porto, pela polícia da cidade invicta quando oferecia à venda, conjuntamente com mais indivíduos, uma caixa com ferramentas de carpinteiro que tinha furtada previamente no concelho de Penafiel.

A sua vida era de permanente risco e desafio com as autoridades, o facto de ter sido condenado ao degredo em Luanda é sinónimo de alguma gravidade das ações praticadas por ele, ou então repetição da chamada pequena criminalidade, deixando de ser “persona grata” no seu território e como mandavam as práticas da época, era encaminhado para as colónias na esperança que aquele território fosse capaz de esconder os habitantes que “não interessavam” à metrópole.

Alguns faziam vida e não voltavam, habituavam-se às condições degradantes daquele território e com algum engenho até conseguiam fazer fortuna, outros optavam por voltar e era isso que aconteceu com o nosso biografado.

Fundamentava que realizava diversas viagens e fixação temporária em Lisboa de forma mais ou menos duradoura, residindo em Queluz, no lugar de Massamá, estrada de Sintra, na companhia de Maria dos Santos, que era considerada sua amante e que o tinha abandonado nos primeiros dias de março. As razões para esse abandono são desconhecidas.

O indivíduo já tinha sido também detido em Lisboa, dois anos antes e sido encaminhado, como era prática da época, para o Governo Civil de Lisboa, onde lhe iriam retirar o retrato que acompanha este texto.

O processo estava aberto e as inquirições iriam decorrer…. Não perca os próximos episódios…

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