Crónicas e opinião
Escrita com Norte: Amor tem hora
Acredito que se possa amar uma pessoa para toda a vida, mas desconfio que se ame sempre, a todo o momento!
Obviamente, esta minha postura não é transmitida pelas estórias lidas, em que se morre por este sentimento, mas pelo Lopes, meu vizinho imaginário com uma vida real, pouco aventureira, muitas vezes (demasiada) pachorrenta, que começa de forma enfadonha com um toque de despertador.
Se o toque lhe provoca desconforto por trinta segundos, enquanto não desperta, já à sua mulher, provoca-lhe um ódio ao mundo e à pessoa que estiver próximo dela durante meia hora. De amado à hora de deitar, Lopes é odiado na hora de despertar… e durante o pequeno-almoço, em que nunca faz perguntas e tenta manter, enquanto come, a respiração controlada e compassada para não irritar a cara metade, apenas responde se algo lhe for perguntado e nunca dá a sua opinião sincera, mas sim o que a sua esposa quer ouvir.
Lopes sai sempre de casa a questionar-se: “Porque raio casou ela comigo?!”.
Se Filomena não lhe demonstra amor pela manhã, ele nunca encontrou resposta à pergunta, não se acreditando que ser jeitoso e uma joia de rapaz entre na equação! Apenas vale para a sua mãe, que se “baba” de orgulho!
Fora de casa, sem coragem para telefonar para o “inimigo”, espera por um sinal, que, geralmente, surge em forma de telefonema ou mensagem, pleno de alegria e “amor” e, geralmente, acompanhado por uma lista de compras, para ele executar ao final do dia.
Se não fosse um rapaz fiel, Lopes juraria que se relaciona com duas mulheres, muito parecidas apenas no aspeto físico. Mas como é, era capaz de jurar que a sua mulher, por vezes, é possuída por um espírito que a apoquenta…e a ele ainda mais! Em vez de dormir com uma cruz na mão e um colar de alhos, prefere acreditar que é feitio!
Lopes, sem nenhum medidor de sentimentos que o mantenha atualizado sobre os batimentos românticos de Filomena, é nas suas expressões que tenta adivinhar com quem se está a relacionar! Como homem que é homem, estes atos de adivinhação provam porque Lopes nunca fez “linha” no Bingo nem acertou mais de duas “cruzes” no euromilhões.
De homem rijo nas futeboladas com os amigos, arruaceiro nas ruas e desrespeitador do semáforo amarelo, em que dependendo do nível de loucura, tanto acelera como trava, sente-se frágil ao pé de Filomena, sentindo que a ama mais vezes durante o dia do que ela a ele.
Como o apetite aguça o engenho, sonha na criação da derradeira geringonça, “O parquímetro do amor”, instalado em casa, onde por vinte cêntimos aparca seguro no coração de Filó, abandonando os exercícios de adivinhação.
Lopes, apesar do pensamento básico, por vezes rudimentar, detém um dos maiores saberes…sabe que se pode amar alguém para toda a vida, mas não em todos os momentos!
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