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E depois da JMJ? O testemunho de quem viveu um momento “irrepetível” (4)

O JA ouviu jovens e monitores que estiveram, ativamente, envolvidos na realização da Pré-Jornada, no concelho da Trofa, no acolhimento dos peregrinos estrangeiros e na participação do grande evento, em Lisboa

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Muito se debateu, muitos tweets se escreveram e muito se falou sobre o alegado retorno da Jornada Mundial da Juventude (JMJ) no nosso país. Muito desse debate centrou-se, claro está, na valia financeira que o evento podia trazer para Portugal, mas, por outro lado, não se generalizou as conversas e os testemunhos de quem viveu a JMJ e o contacto com o Papa Francisco.
O JA ouviu jovens e monitores que estiveram, ativamente, envolvidos na realização da Pré-Jornada, no concelho da Trofa, no acolhimento dos peregrinos estrangeiros e na participação do grande evento, em Lisboa.

Filipa Lopes, Bougado

Foi em 2016, nas Jornadas Mundiais da Juventude da Polónia, que o Papa Francisco nos alertou para o perigo de nos acomodarmos no sofá. Curiosamente, em 2020, fomos coagidos a ficar em casa. Esse período confuso e doloroso para a humanidade serviu, no entanto, para dar razão às palavras de Francisco: o sofá suga-nos, deixando rapidamente de ser um lugar confortável. Foi, então, quando o bicho Covid se acalmou que o bicho carpinteiro se ergueu, ansioso por calçar as sapatilhas e partir apressadamente. A Trofa quis, desde logo, acolher 1300 jovens de todo o mundo – não com a pressa que é inimiga da perfeição, mas com a pressa de quem está muito entusiasmado e precisa urgentemente de partilhar essa alegria.

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A presença destes jovens veio acentuar a beleza de observarmos novamente os lugares que deixámos de ver realmente por nos serem tão familiares. Vivo na Trofa há mais de uma década, mas foi durante as Pré-Jornadas que mais me senti trofense. Com vontade de dar a conhecer esta cidade, regressámos a uma genuína curiosidade pela História da Trofa. Além disso, recebemos a perspetiva de quem vive muito longe. Recordo o encanto dos peregrinos do Cazaquistão ao reparar na moldura verde que enquadra a cidade – o verde das árvores e das plantações de milho – e o que até então se afigurava banal ganhou, assim, uma nova dimensão. Muitos desses peregrinos emocionaram-se também no Porto, nos Dias da Diocese, ao ver e ao sentir, pela primeiríssima vez, o mar, o oceano.

Em Lisboa, havia também um vasto mar de gente: nacionalidades distintas inundavam as ruas, cantando em uníssono nos mais diversos idiomas. Relembro o momento em que um milhão e meio de pessoas fez surgir, também em uníssono, um poderoso silêncio. Imersos nesse silêncio, não foi preciso rezar com palavras – éramos a própria a oração. Ao longo daqueles dias, assisti também ao “re-significar” de rituais cristalizados. Na Trofa, as missas em russo mostraram-me que a Eucaristia pode ser composta por outros gestos.

Em Lisboa, na Igreja onde estavam os irmãos jesuítas, decidi confessar-me. Quando terminei, reparei que um amigo meu estava a fazer o mesmo, o mesmo amigo que dias antes me tinha dito não compreender a confissão. Ali, ambos abandonámos a ideia de confissão como sentença para dar lugar ao conceito de confissão como conversa iluminada. Graças ao exemplo do Papa Francisco, encontrei uma Igreja mais voltada para a simplicidade, despida de vanidades e respostas automatizadas. Parece estar a tornar-se sólido o projeto de uma Igreja marcada por um diálogo ecuménico, onde “todos, todos, todos” podem participar.

Gostaria ainda de destacar os três momentos em que estive muito perto do Papa, mas não sei muito bem explicar o que acontece quando se vê Francisco. Creio ter presenciado algo muito semelhante à passagem bíblica que relata a entrada de Jesus em Jerusalém – se nos calássemos, até as pedras ao longo da estrada começariam a aclamá-Lo (Lucas, 19: 40). De facto, a passagem de um ser humano verdadeiramente bom é sempre triunfal, porque, de uma forma ou de outra, nos transforma.

Enfim, a prova de que existimos é trivialmente associada ao facto de podermos ver e tocar a carne e osso de que somos feitos e, por isso, enrolamo-nos em gestos e palavras quando queremos apontar para a alma, mas esse histórico mistério passou a ser visível e palpável durante estas Jornadas. O corpo teria cedido ao calor e à dificuldade em caminhar tantos quilómetros de mochila às costas. O que nos moveu foi a alma inquieta à procura da santidade. Não é isto um sinal de esperança?”

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