Edição 492
Crónica Verde: As estações
Eu gosto do Outono. Gosto das folhas pintadas com as cores do fogo e gosto de as sentir a crepitar debaixo dos pés, depois dos ventos as soltarem das árvores. Gosto do recorte dos ramos despidos contra o céu azul suave. Gosto dos dias mais frescos e até, vejam lá, da chuva (apesar de nem sempre achar piada a apanhar uma molha).
Na verdade do que eu gosto é das estações. Gosto do facto de haver estações (ainda que por estes tempos andem um pouco confusas) a marcar o ritmo da natureza, o ciclo da vida. Gosto que cada estação traga um espectáculo diferente, do qual podemos ser mais do que meros espectadores.
Eu sei que já por aqui disse isto: andamos desligados da natureza e, consequentemente, andamos desligados de nós mesmos. Ou vice-versa.
Acho que devíamos voltar a celebrar a chegada das estações. Festejar propriamente os solstícios e os equinócios. Como faziam os antigos. Eram de tal monta os festejos que ecoam até os dias de hoje, camuflados nas celebrações religiosas.
E porque não recomeçar a fazê-lo? Na verdade já nem é uma ideia original porque há mais quem esteja a redescobrir que a passagem das estações merece ser assinalada. O que é bom, não é? É sinal que nos vamos apercebendo que temos de nos “ligar” de novo…
Assim, nos últimos tempos, têm surgido novos rituais, festivais de equinócios e celebrações de solstícios, uns mais badalados (como a Festa de Outono de Serralves) do que outros. Se procurarmos – nos dias anteriores às festividades – encontramos informação sobre pequenos grupos de pessoas, em várias zonas do país, que se juntam (e convidam quem esteja interessado) para reavivar tradições ancestrais, buscando um maior contacto com a natureza.
Nenhum destes encontros é perto de si? Porque não criar uma nova tradição familiar? E nem tem que ser no dia específico da mudança de estação. É o bom de sermos nós a decretar a festa…
Estamos no outono. Escolha um domingo e vá com os seus até ao jardim mais próximo observar as árvores a preparem-se para o inverno. Vá à feira, compre marmelos, ensine os mais pequenos a fazer marmelada e encha a casa com o aroma reconfortante deste doce. Se puder, viaje até uma zona de castanheiros e apanhe as castanhas brilhantes que espreitam dos ouriços. Vai ver como lhe sabem muito melhor, quando as assar, mesmo que também traga umas picadelas nos dedos. Gosta de cogumelos? Inscreva-se numa das muitas saídas de campo que têm surgido e aprenda a identificar os belos exemplares que, por esta altura, brotam dos solos ricos. Mas coma apenas os que são apanhados por quem realmente sabe o que faz!!! Fale connosco e venha passar uma tarde a ajudar-nos a construir uma barraca de milho, uma tradição (também) da nossa terra – Coronado – que se perdeu e que procuramos, agora, recuperar.
Ou, muito simplesmente, numa destas tardes suaves de outono, saia para dar um passeio. Meta as mãos nos bolsos, puxe a gola do casaco e caminhe, sentindo o ar fresco, que o sol já não consegue aquecer, no seu rosto. Depois, diga-me se não se sentiu revigorado ao voltar a casa.
Ema Magalhães | APVC
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