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Crónicas e opinião

Avenças, ajustes directos e a importância do escrutínio

“Fazia falta mais escrutínio nas autarquias. Todos saíamos a ganhar. Todos menos as clientelas locais dos partidos que se comportam como pequenos aristocratas. E que um dia, sem darmos por ela, estão sentados no parlamento ou no conselho de ministros, para nosso grande espanto.”

João Mendes

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Durante vários anos, primeiro no blogue …e a Trofa é minha, depois nas páginas deste jornal, denunciei inúmeros ajustes directos e avenças atribuídas pelo executivo camarário da Trofa que, no meu entender, configuravam conflitos de interesse e favorecimentos inaceitáveis numa democracia digna do nome.

Das nomeações de elementos da JSD, sem qualquer tipo de experiência relevante, até às diversas avenças com militantes e familiares de dirigentes do PSD Trofa, passando pelo jornal de campanha da coligação Unidos pela Trofa, o Correio da Trofa (financiado pelos elevadíssimos impostos imputados aos trofenses), ou por ajustes directos suspeitos na Trofáguas, incluindo um assinado com uma empresa que não existia à data da celebração do contrato, viu-se de tudo no nosso concelho.

À falta de respostas para a opacidade gritante destes casos, e de muitos outros para os quais não tenho espaço nesta crónica, a reacção do poder foi sempre a mesma: mentiras, insultos, argumento infantis como “és do contra” ou “tens inveja” e, claro, o suprassumo dos argumentos patéticos: “este executivo tem obra”, como se alguma vez o tivesse negado ou, pior, como se ter obra fosse carta branca para viciar concursos públicos ou pagar favores de campanha com o dinheiro de todos os trofenses.

Azar de Luís Montenegro, não é Trofa que governa. É o país. E se os ajustes directos celebrados com a autarquia laranja de Vagos passaram pelos pingos da chuva aquando da campanha para as últimas Legislativas, cujo autarca, à data, foi recentemente promovido a secretário de Estado pelo primeiro-ministro, a recente avalanche de factos que foram tornados públicos acabarão, muito provavelmente (à data que escrevo estas linhas, a moção de confiança ainda não foi votada), por derrubar o governo PSD/CDS/PPM.

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E que factos são esses?

Imagino que não sejam novidade para nenhum de vós, mas, em todo o caso, aqui fica um resumo: tudo começa na Spinumviva, empresa totalmente dependente dos contactos e influências de Montenegro, com avenças de várias empresas com interesses directos no Estado, com a Solverde à cabeça. A seguir descobrimos que Montenegro governou em violação da lei da exclusividade. Depois vieram os constitucionalistas, da esquerda à direita radical, unânimes em torno da ideia de que não restava outra alternativa que não fosse a demissão do primeiro-ministro.

Segue-se uma moção de confiança, morta à nascença como as moções de censura apresentadas por PCP e Ventura, e a queda do governo. E eleições em Maio, fazendo de 2025 o mais intenso ano eleitoral de que há memória. Os portugueses vão a votos três vezes: Madeira, Legislativas e Autárquicas. Para não falar nas presidenciais no início do ano seguinte.

E porquê?

Porque o escrutínio fez o seu trabalho. E fê-lo sem ser manietado, sem intimidação de familiares, sem ameaças (consumadas) de despedimento sem justa causa ou pressões de outra natureza, capazes de o parar. Fazia falta mais escrutínio nas autarquias. Todos saíamos a ganhar. Todos menos as clientelas locais dos partidos que se comportam como pequenos aristocratas. E que um dia, sem darmos por ela, estão sentados no parlamento ou no conselho de ministros, para nosso grande espanto.

Como é que este boy inútil e sem currículo chegou ali?

Fácil: chegou à boleia do caciquismo e da falta de escrutínio. Na Trofa como em Lisboa.

É preciso escrutinar mais. Cada vez mais.

Escrutinemos.

Porque se não escrutinarmos, somos cúmplices do estado a que isto chegou.

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