Ano 2009
“Arte sacra é uma arte imaginária”
Com 79 anos Alberto Vieira de Sá Vinhas é um dos poucos homens que ainda dá vida à arte-sacra, na freguesia de S. Mamede do Coronado. Quem visita a oficina do “mestre”, na Rua Vale do Coronado, pode ver de perto as verdadeiras obras de arte que partem desta freguesia do concelho da Trofa para todo o país e até estrangeiro.
A viver em S. Mamede do Coronado desde os dois anos de idade, Alberto Vinhas seguiu os passos do pai e, logo aos 11 anos, começou o ofício na oficina do progenitor que, por sua vez, foi aprendiz do já falecido artista conceituado José Ferreira Thedim.
“Uma arte imaginária na qual se procura realizar o melhor possível dentro dos princípios da arte religiosa”. É desta forma que Alberto Vinhas define a arte à qual se dedica há já 68 anos e aquela que chama de “paixão da sua vida”. Volvidos quase 70 anos depois de dar os primeiros passos nesta tradição da freguesia, este mamedense ainda passa cerca de 10 horas por dia a esculpir e a dar forma às obras que nascem das suas mãos e que podem ser as mais variadas. “É raro haver repetições, excepto em relação à imagem de Nossa Senhora de Fátima”, conta em entrevista exclusiva ao NT.
Figuras do Cristo Ressuscitado, Alberto Vinhas já fez pelo menos quatro, uma delas com três metros de altura, sendo esta a maior figura que alguma vez esculpiu. Ao longo de todas estas décadas, a arte de Alberto Vinhas tem chegado aos quatro cantos do país e até do mundo. As quatro figuras com 2,5 metros de altura instaladas na Catedral de Luanda são apenas alguns exemplos que constam no infindável currículo artístico deste mestre. O mamedense já perdeu a conta ao número de imagens que esculpiu ao longo da sua vida, mas sabe bem qual é a “menina dos seus olhos”: a imagem de Nossa Senhora da Assunção que já completou meio século. “É a obra mais trabalhosa e mais importante dentro da arte religiosa”, explicou.
Em média, Alberto Vinhas precisa de cerca de três semanas ou um mês para concluir uma figura, mas “há obras que podem demorar meses a acabar”, assegura. Depois de realizado um estudo prévio para conceber a figura, a maquete é colocada à aprovação do escultor responsável pelo trabalho e, posteriormente, sujeito à aprovação final do cliente, explicou Alberto Vinhas. Os preços podem variar, mas em média, o valor de uma imagem ronda os 1500 euros.
“Se houver escola e gente a trabalhar o património vai-se enriquecendo”
Ciente de que a arte-sacra está ameaçada pela extinção, Alberto Vinhas lamenta que em S. Mamede do Coronado não haja seguidores desta arte. O artista mamedense sublinhou a importância de “manter viva esta tradição e dinamizá-la no futuro” e, para isso, defende a criação de um museu de arte-sacra na freguesia, com uma escola profissional integrada. Ao NT, Alberto Vinhas adiantou que o anterior executivo municipal já teria realizado uma proposta ao artista, que consistia na compra da oficina de que é proprietário para ali construir um museu-escola.
De acordo com Vinhas, elementos da Divisão da Cultura da Câmara Municipal, então liderada por Bernardino Vasconcelos, visitaram a sua oficina onde, durante cerca de um ano e meio, fizeram um levantamento de toda a obra existente, com registo em fotografia e vídeo, mas o projecto não foi levado a avante. Actualmente, Alberto Vinhas ainda se encontra à espera de uma nova decisão por parte do novo executivo municipal, agora liderado por Joana Lima.
“Se houver escola e gente a trabalhar o património vai-se enriquecendo e crescendo”, lembrou, explicando que “agora falta saber se a Câmara quer adquirir o património ou não”. Alberto Vinhas reconhece que a arte-sacra “não tem muita perspectiva no futuro” e considera que “o valor cultural não sobrevive se não houver realização económica”. “É desta arte que tenho sobrevivido, sinto-me realizado, mas tem de me compensar economicamente”, admite.
Recorde-se que o actual presidente da Junta de Freguesia de S. Mamede do Coronado, José Ferreira, integrou no seu programa eleitoral durante a campanha das eleições autárquicas a criação de um “museu ou espaço museológico de arte sacra” e ainda a “criação de uma escola-oficina de arte sacra”.
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