Crónica do Toni (parte II)

A única coisa interessante que Toni aprendeu não foi na escola, mas sim a ouvir um estranho na taberna do bairro, que falava de tempos idos e de grandes Impérios. Ficou fascinado e fixou a história de Júlio César, o Grande Conquistador das Gálias e Ditador Vitalício de Roma e de seu sobrinho Octávio, que após ganhar a batalha marítima contra Marco António viria a ser o 1º Imperador de Roma, O Grande César Augusto e nesta história ficou fascinado pela sua figura.

Após deixar a escola, Toni estava decidido a entrar no mundo do trabalho, mas a fazer algo que não fosse muito duro nem com horários rígidos.

– É isso, vou começar a ir aos recados para a minha mãe e a minha avó! – Exclama, altamente esfuziado por esta ideia brilhante.

A ideia de Toni não era cobrar o serviço, mas sim ficar com o troco das compras. Durante dois meses andou sempre com trocado nos bolsos, começou a tomar café e a ir à taberna com mais frequência e pela primeira vez, já com 15 anos, arrisca convidar uma miúda para lanchar e leva a primeira nega.

Este negócio prosperava, mas Toni foi descoberto e a sua mãe e avó começaram a mandá-lo às compras com o dinheiro contado. A mina de ouro acabou, tinha que pensar em alternativas.

Toni pensou e decidiu, – Vou ser aldrabão! – Ou seja, decidiu ser biscateiro.
Mas ele não percebia nada de nada, portanto, arranjava o serviço, pedia ao cliente dinheiro para ir comprar o material e nunca mais aparecia, começou a ganhar fama como o “Biscateiro Fantasma”. Até hoje Toni mantém esta actividade, nunca repetindo a mesma zona para a sua prática.

Recebeu o primeiro gesto de carinho, quando com 12 anos, ao regressar a casa, vindo da escola, um pássaro pousa no seu nariz e dá-lhe sete bicadas na testa.

Outro acontecimento de referência, mais tardio, foi aquando da visita da sua avó paterna, quando fez 18 anos. Os dois, ao cumprimentarem-se, Toni, desastrado como sempre, desequilibra-se e encosta os seus lábios a meia boca da avó que inesperadamente tosse e projecta a sua dentadura, ficando esta pendurada no lábio inferior do neto.

Assim entrou na maioridade com a sua experiência suprema de cariz romântico!

Toni continua virgem e no seu imaginário, começou a olhar para o seu pénis como se fosse outra pessoa e não o prolongamento do seu ser, tratava-o por Geraldo, um seu amigo, com quem mantinha alguns monólogos – “Então Geraldo, vamos às moças? Ontem saquei duas! E tu? Nenhuma como o costume, hi,hi” – Toni projecta todos os seus fracassos para o seu amigo Geraldo e sente-se bem.

Toni é um homem de projectos e como sabe que as resoluções de Ano Novo não duram mais de duas semanas, toma resoluções para executar antes do ano acabar…a saber:

Arranjar uma mulher para o seu amigo Geraldo – Prazo, 31/12/2024;
Como o negócio de biscateiro corre benzinho, pretende vender a motorizada e comprar um Ford Fiesta, usado, em 4ª mão – Prazo, depois de amanhã;
Construir um barraco na freguesia vizinha e arranjar documentação falsa comprovativa de que tem 3 filhos (que não existem), para pedir o rendimento mínimo garantido – Prazo, ainda hoje;
Ser abençoado pela inspiração divina – Prazo, no dia de Natal;
Ser cada vez mais interessante – Prazo, desconhecido.

Relativamente a este último ponto, apesar da auto-estima de Toni, uma das poucas coisas que sabe é distinguir de olhos fechados o vinho verde do maduro.

Apesar do que nos foi dado a conhecer, sobre a nossa personagem, através desta crónica, Toni no seu íntimo, no seu “eu” mais profundo é um homem sensível e romântico, que ainda hoje guarda a recordação e o amor pela sua professora, que tantas vezes lhe pôs orelhas de burro, mas era o momento em que Toni a sentia próxima e Maria lhe tocava os cabelos com as suas mãos e ele sentia coisas que não sabia explicar!