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Trofa

Escrita com Norte: Traficante

“Tornei-me traficante.”

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Tornei-me traficante.
Trafico estados de alma e de humor, para quem quiser e precisar.
Tenho alma de traficante, trafico tudo aquilo que não se vê. Transaciono ideias, pensamentos e estados de euforia, desde arrebatados a estados de tristeza. Vendo conhecimento do “eu” e percepção do “outro”. Negoceio a sabedoria de saber estar só e a aprendizagem de não subestimar os outros.
Contrabandeio sorrisos, de acordo com as situações, e vários tipos de atitudes irónicas com ou sem sarcasmo. Tenho uma panóplia de cinismos para cada “verdade” que se apresente mais prepotente.
Tenho ainda algumas culpas já muito gastas que ficaram aqui, de coisas menos boas, que troco por uma auto-comiseração em bom estado. Vende-se bem.
Vendo a arte de vender a quem não quer comprar e compro unicamente o que posso vender.
Sou traficante de vaidades, de egos exacerbados e de enjoos de mediocridade.
Vendo gritos contidos, de raiva, de vitória e sem razão.
Vendo silêncios, dos bons, daqueles que não se ouvem. E aqueles com defeito, digo ao comprador que anda a ouvir coisas…tenho um mudo na montra, para mostrar a qualidade do produto.
Sou vendilhão no mercado, onde impinjo amores. À clientela digo que todos são frescos, sendo alguns do passado, enterrados na areia do último verão…passo-lhes um produto especial, que lhes dá brilho e os põe dentro do prazo.
Para quem pode, mostro os amores do último catálogo. Na capa, tenho carinho e afeição, e nas páginas centrais, tenho paixão, excitação e tentação.
Ofereço angústias, descontentamento, arrependimento e outras coisas mais em troca de outras coisas menos…aceito alegria, amor, saúde e riqueza.
Negoceio tudo ás escondidas em noites de lua cheia. Gosto de ver a cara dos enganados, cegos por um “sim” depois de um dia de “nãos”. Neste momento trafico “sins”, o produto com mais saída, que causa mais dependência. Arranjei dois empregados para traficar em inglês e francês, além do “sim”, trafico o “yes” e o “Oui”, em diversos volumes e tons.
Ilegalmente, ando a cultivar em mim a saudade, para quem nada tem, e o espanto, para quem nada faz. Já cultivei o medo e o desespero, mas tiveram pouca saída…é preciso saber ler os mercados.
Sou uma fábrica de sentimentos ilimitados, desde os de marca branca até aos mais requintados, tanto vendo “cisma” a um preço em conta, como o melhor dos “amores” a preços aceitáveis.

Não nasci a querer ser traficante, foi um acaso da pré-adolescência, quando junto à linha do comboio, próximo da casa dos meus avós, sorri-lhe e ela sorriu-me!

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