Edição 601
Escreve… Mesmo que não voltes a ler
Esta semana “tropecei” num artigo que continha algumas dicas sobre como ser mais organizado diariamente, na nossa vida.
Um dos conselhos falava, precisamente, da escrita. Dizia o ponto do tal artigo para escrevermos o que vamos fazer, mesmo que não voltemos a lê-lo. A ideia por trás desta atitude é a de que, quando escrevemos o que pensamos, conseguimos memorizar mais facilmente, fazer uma espécie de uma nota mental mais forte do que o simples “tenho de me lembrar de…”.
Como é hábito, tentei levar esta questão ao extremo e pensar em mais utilidades desta atitude, assumindo que é verdadeira. A mais simples que me surgiu prende-se com o estudo, com a aquisição de conhecimento. A forma mais básica de estudarmos algo, quer na escola, quer na vida em geral, será a fazer resumos. Muitos podem questionar a utilidade, em termos de tempo perdido (como eu), mas não tenho dúvidas de que ajudará a memorizar.
Tudo isto me parece, no entanto, demasiado simplista para aquilo que acho que a escrita pode fazer por nós.
Conversava com uma amiga recentemente (obrigado, Inês) sobre a escrita e a leitura e falávamos de como, provavelmente, escrever poderá ajudar pessoas que tenham graves problemas psicológicos, como, por exemplo, a depressão. Não que cure a doença, como é óbvio, mas que ajude. Que torne as coisas mais leves. E eu acredito que haja mesmo alguma verdade nisto.
Vejamos. Não conheço os números atuais sobre a depressão, quer a nível nacional, quer a nível mundial. Mas não preciso para me focar no ponto que acho mais essencial: somos cada vez mais queixosos. Estamos constantemente a emitir juízos de valor negativos sobre as pessoas que nos rodeiam, sobre o meio em que estamos inseridos, sobre o mundo em que vivemos. E, quando as coisas correm mal, arranjamos uma mão cheia de bodes expiatórios. O leitor pense comigo: se pudesse ter acesso a todos os seus pensamentos diários, sobre tudo e mais alguma coisa, sobre as pessoas, sobre o trabalho, sobre as notícias, essa leitura seria deprimente ou feliz? Haverá as exceções, como sempre. Mas na grande maioria (e contra mim falo, muitas vezes) teria uma leitura deprimente.
Não podemos desvalorizar os efeitos que um permanente queixume traz às nossas vidas. É um ciclo vicioso e, quando damos por nós, estamos presos. Presos numa espécie de tornado de pensamentos e de acontecimentos negativos. Quando podemos ter – por mínimo que seja – um impacto nisso.
Portanto, caro leitor, escreva os seus pensamentos. Quando estiver irritado, escreva. Mesmo que não volte a ler.
Livro da Quinzena: O Matemático Disfarçado, Michael Starbird. Sou completamente a favor de sairmos da nossa zona de conforto na vida em geral e… na leitura em particular. O último livro que li alia a matemática ao humor inteligente e quebra alguns dogmas e alguns conceitos demasiado profundos que temos sobre os números e sobre a matemática. Vale a pena!
Literariamente, estamos conversados.
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