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Edição 579

Festas de Nossa Senhora das Dores da Trofa – 250 anos

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Parte 1: A genesis – “Honrar a memória dos antepassados”
As Festas de Nossa Senhora das Dores são um marco comum na história de todos os trofenses e de muitos que, por familiaridade, visitam a Trofa. Numa ou noutra fase da nossa vida recordamos momentos lá vividos e não ficamos indiferentes a esse mês de agosto, mês de férias, mas também da grande romaria para os trofenses. Ao longo dos anos, a forma como as festas foram sendo realizadas sofreram, naturalmente, graduais alterações por mudanças de hábitos sociais, pelas condições económicas de cada momento e renovação da população que aporta mudanças de mentalidades e costumes.
Na génese, tudo começou com a vontade de erguer uma pequena ermida, decorria o ano de 1766, com uma petição entregue pelos moradores de S. Martinho de Bougado ao Bispo da diocese do Porto, licença para a construção no lugar então chamado de “Monte da Carriça”, em honra da Virgem das Dores, designada à data de “Nossa Senhora das Dores da Maia”. Era Abade Inácio de Morais Sarmento Pimentel, que iniciara funções em 1750, devoto de S. Martinho, padroeiro da freguesia, mas não menos fervoroso de Nossa Senhora das Dores, tendo desempenhado um papel impulsionador junto dos fiéis. A obra ficou concluída em pouco mais de um ano, realizando então uma festa de inauguração que, ano após ano, se foi repetindo, tornando-se numa das mais afamadas romarias do Norte – a festa em honra da Nossa Senhora das Dores.
Um século mais tarde, o elevado número de visitantes e o estado arruinado da pequena capelinha, levou à sua substituição, pela atual Capela de Nossa Senhora das Dores, com os traços que atualmente reconhecemos, tendo a obra iniciado em 1879, com os encargos da obra suportados pelo comendador Ribeiro de Santo Tirso, mais tarde Conde de São Bento. Desde então até aos nossos dias, a capela foi sofrendo algumas alterações, como foram exemplos a aquisição dos sinos, imagens religiosas e alguns ornamentos, azulejos, lambrins e mais recentemente vitrais. A última grande intervenção de restauro decorreu entre os anos de 2012 e 2013, mas sempre em respeito à traça original.
A excelente localização da Trofa, que ocupa a margem esquerda do rio Ave, servindo ainda de ponto de encontro de caminhos que se cruzavam, mesmo nas traseiras da Capela da Nossa Senhora das Dores, que viriam dar travessia a duas importantes estradas nacionais (EN14, que liga o Porto a Braga e a EN104, que liga Vila do Conde a Santo Tirso), que conferiram grande movimento e visibilidade aos espaços que as circundavam, alicerses do primeiro grande aglomerado populacional a que se viria a dar o nome de Catulo.
O aparecimento dos caminhos-de-ferro, no ano de 1883, que situou a  estação da Trofa  a cerca de 400 metros da Capela Nossa Senhora das Dores, mas cuja linha férrea passava a cerca de 50 metros da sua  porta principal, dividindo mesmo o espaço a meio, onde para além do Parque Nossa Senhora das Dores, nasceu o Parque Dr. Lima Carneiro, tornou-se relevante, quer para a divulgação das crescentes  festas da Senhora das Dores da Trofa, quer para o transporte de muitos forasteiros que, da janela dos comboios, eram atraídos ao local da romaria.
A chegada dos comboios à Trofa acompanhou a época áurea do transporte ferroviário que marcava assim um novo ritmo na vida das pessoas, fixando as suas lides nos postos de trabalho por ele criados, que rapidamente conduziu a um novo tempo social, ajudando a impulsionar as atividades industriais, com o nascimento das primeiras indústrias na Trofa, como foi exemplo a moagem, a metalomecânica, o têxtil, a construção civil, entre outras, graças à facilidade de mobilidade de mercadorias, de novas pessoas e de novas ideias.
 Com elas e com os seus descendentes, apareceram novas formas de expressão que deram corpo a um novo conceito social, com o aparecimento das tascas e cafés, do teatro e do cinema (no Teatro Alves da Cunha), o futebol que deu origem à fundação do Clube Desportivo Trofense (1930), a música com o aparecimento da Banda de Música da Trofa (1951), da imprensa escrita, entre outras. E claro, ao sabor do tempo, as romarias de onde as festas em honra de Nossa Senhora das Dores assumiram papel de destaque, desde logo pela fé muito enraizada na comunidade que convivia muito de perto com a paróquia, mas também pela oportunidade de presença social, numa sociedade em transformação e que via parte da sua franja abandonar a sua condição rural, soltando-se um pouco dos campos, que até então constituía o seu único modo de vida.
Atualmente, a estação “velha” está desativada e abandonada, desde o dia 14 de agosto de 2010, tendo todo o tráfego ferroviário sido transferido para a Estação Nova da Trofa, uma bonita obra arquitetónica inspirada na desmantelada Ponte Pensil existente sobre o rio Ave (1858-1934), construída numa zona mais periférica do centro da nova cidade (elevada a 2 de julho de 1993) e sede do também novo concelho da Trofa (criado em 19 de novembro de 1998), que dificultou a utilização deste meio de transporte para os visitantes. Presentemente, não se afigura como tão indispensável este meio de transporte, como no passado, dado que o acesso a viaturas próprias está mais vulgarizado, mas que deixam muitos sem alternativas pela inexistência de uma rede integrada de transportes urbanos.
Em termos operacionais, a dinamização das festas ficam a cargo das aldeias que se vão revezando, ano após ano (Ervosa, Abelheira, Esprela, Finzes, Gandra, Mosteirô, Paradela, Paranho, Valdeirigo, S. Martinho, Corôa Real e Carcajoso), com a eleição de comissões de festas, que sustentam uma rivalidade salutar, e que promovem um sem fim de tarefas, quer para a dinamização de gente e sensibilização para o apogeu, normalmente o terceiro fim-de-semana de agosto, mas também para a angariação de verbas para custeio de todas as despesas das festividades.
Um dos momentos religiosos mais altos acontece com a procissão em honra de Nossa Senhora das Dores, simbolizada pelos seus 10 majestosos andores em que participam todas as aldeias. O seu porte e imponência dá-lhes lugar de destaque em todo o Portugal, com o percurso habitual da Igreja matriz de S. Martinho de Bougado, passando pela romaria no centro da cidade da Trofa, chegando depois à capela, onde dá uma volta, regressando de seguida ao local de partida sempre por entre olhares de milhares curiosos para verem andores de cerca de 15 metros de altura (dividindo-se em base, oratório e coroa) e com um peso que oscila entre os 450 e os 600 quilos. O trabalho é árduo para a sua preparação e requer mais de 250 horas de conhecimento e dedicação. Pessoas, que muitas das vezes vão em cumprimento de promessas, suportam os majestosos andores durante o percurso de quase um quilómetro. A tradição e o esforço descomunal de quem carregava os andores aos ombros, em grupos que rondam os 12 homens, foi substituído nos últimos anos por estruturas de suporte em ferro e rodas de borracha que suavizam o esforço, mas não retira a necessidade de perícia a quem os manuseia e a beleza a quem assiste ao espetáculo!
(Agradecimentos a todos os que deixaram escritos, narrando datas e acontecimentos, que permitiram fazer referências históricas de uma Trofa que não conheci)

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