Edição 571
Os offshores do nosso descontentamento
O termo offshore vem dos tempos dos corsários que saqueavam os barcos em alto mar e depositavam a pilhagem offshore (fora da costa). Nos tempos atuais as pilhagens são apelidadas de habilidades fiscais, mas os financeiros e outros quejandos, os corsários dos tempos modernos, continuam a depositar a pilhagem «fora da costa» dos seus países, nos paraísos fiscais, apelidados de offshores.
As contas bancárias e empresas abertas em paraísos fiscais, os offshores do nosso descontentamento, têm servido para pagar menos impostos do que no país de origem dos seus proprietários, pois deixam de estar sujeitas ao regime legal vigente de onde são originários. A maioria dos países que permitem este tipo de habilidades fiscais ficam em ilhas (Jersey, Bermudas, Ilhas Cayman e outras), mas também existe nalguns países europeus, como o Luxemburgo e Mónaco e nalguns Estados dos EUA, com Delaware à «cabeça», que fica localizado no centro da costa leste americana, pois é considerado, dentre todos os estados americanos, o que mais proporciona vantagens a empresas.
Algo semelhante é o que se passa nos países que possuem uma legislação de origem britânica e usam o conceito de trust. Este conceito diz respeito a uma relação em que a propriedade é mantida por uma parte, em benefício de outra. Este expediente é muito usado quando se pretende ocultar a identidade do verdadeiro dono do negócio e o banco só fica conhecedor do nome dos administradores ou procuradores desses bens, ignorando os verdadeiros donos do dinheiro depositado, impossibilitando o poder judicial de saber quem são os verdadeiros proprietários e a origem desse dinheiro.
Uma das maiores fugas de informação de sempre, neste tipo de negócio, que originou a investigação «Papéis Panamá», já teve o seu início há algum tempo e conseguiu identificar mais de duas centenas de portugueses, com envolvimento em sociedades offshores criadas pela empresa «Mossack Fonseca & Co.», que é a quarta maior no ramo de criação de empresas em paraísos fiscais e os seus proprietários são Jürgen Mossack, nascido na Alemanha mas que cresceu no Panamá, e Ramón Fonseca, um político do Panamá. Esta empresa, com sede no Panamá opera em Malta, Holanda, Suíça, Luxemburgo, Chipre, Baamas e Ilhas Virgens, para além do Panamá.
Não é admissível que uma empresa opere num país, como Portugal, por exemplo, e tenha a sua sede na Holanda ou noutro paraíso fiscal. Usufrui de bens e equipamentos construídos com o erário público e vão pagar os seus impostos noutros países. Esta evasão fiscal, para além de injusta é imoral, inaceitável e condenável, pois a maioria dessas empresas utiliza os offshores para atividades ilícitas.
Os dados, provenientes de estatísticas da Autoridade Tributária e Aduaneira de Portugal indiciam uma dimensão do escândalo de proporções grandiosas. Entre 2010 e 2014, empresas e particulares transferiram cerca de 10.200 milhões de euros para offshores. A lista dos paraísos fiscais é extensa, com Hong Kong a ser o destino preferido dos portugueses, para onde foram transferidos ao longo dos cinco anos 2.367 milhões de euros, seguido do Panamá 1.301 milhões de euros, para além das Ilhas Caimão, os Emirados Árabes Unidos, as Bahamas, Andorra, as Maldivas e as Ilhas Virgens. Os valores indicados são só os oficialmente conhecidos. A dimensão dos valores que não se conhecem oficialmente deve atingir valores «astronómicos», que resolveriam os problemas graves com que o país se defronta.
Os offshores são corrosivos para a democracia, por isso é que deveria ser estabelecida uma condenação a quem utiliza este tipo de habilidade fiscal e deveriam acabar todos, mas todos os offshores em todo o mundo. Para benefício de todos, menos dos prevaricadores.
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