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Ano 2007

«Pergunto ao vento que passa Noticias do meu país…»

Publicado

em

atanagildolobo

     Hoje era para escrever sobre ti, Adriano. Contar simples coisas que as pessoas não sabem. Decorreram 25 anos no passado 16 de Outubro que te foste "embora de viola ao ombro", como diz o soneto de Manuel Alegre. Contar que o teu disco " Adriano Correia de Oliveira" foi premiado com o prémio Pozal Henriques, a maior distinção da música ligeira em Portugal.

 Que a revista inglesa Music Week considerou-te o Artista do Ano quando gravaste o disco "Que nunca mais". Mas sobretudo narrar a tua luta estóica, no tempo da ditadura fascista, pela liberdade, na denuncia do fascismo e da guerra, logo com a Trova do Vento que Passa em 1963, e mais tarde com O Canto e as Armas. Contar também a tua  coerente e consequente luta contra a exploração, contra a miséria, pela transformação do mundo. Assim surge a Margem Sul, de Urbano Rodrigues, em pleno fascismo, a apologia do direito dos trabalhadores rurais e camponeses à posse da terra, a rejeição da miséria, a memória de Catarina Eufémia, a alusão à transformação na « foice dos teus ceifeiros…como bandeira sonhada ». Descrever as tuas façanhas, a tua generosidade, a tua entrega… falar das tuas canções. Daquelas menos conhecidas como a canção do linho, dedicada aos trabalhadores da nossa região com aqueles versos de luta e combate : « Já se vai tecendo ao norte um novo linho / Feito da luta mais forte nas oficinas do Douro e Minho / Já nos teares se levanta um canto grave / Que sai de cada garganta dos operários de ao pé do Ave.» . Testemunhar a tua constante disponibilidade de graciosamente participares com o teu canto único, « o cantar que não se agarra» como escreveu Ary dos Santos, em qualquer colectividade popular, em qualquer fábrica, ou em qualquer organização do PCP, de que foste sempre militante, obreiro da liberdade e da esperança, com a tua estatura imponente, mas com um coração ainda maior…

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     Era para escrever sobre ti, Adriano, porque nunca te vendeste por preço algum. Porque és uma das mais belas vozes da canção popular portuguesa.

     Então, senti que gostarias de saber notícias do teu país. E decidi escrever-te… para te dizer que não cantaste em vão. A luta que abraçaste continua de pé. No dia 18 de Outubro a malta inundou as ruas de Lisboa. Milhares e milhares a desfilarem na manifestação promovida pela CGTP. Exército multicolor de luta e esperança, repleto de solidariedade. Trabalhadores metalúrgicos, químicos, agrícolas, têxteis, rodoviários, ferroviários, da construção, da hotelaria, dos serviços e comércio, professores, funcionários públicos… e também, já me esquecia, estudantes da academia de Coimbra, da tua academia, Adriano. Nós também lá fomos, a malta da Trofa, de Guidões, dos Coronados, os trabalhadores da Preh. A manifestação ondulava e serpenteava por ruas e avenidas, mesclada de vermelho, verde, azul, branco, amarelo, verde e preto das bandeiras. Os cartazes e as faixas com palavras de ordem, empunhados pelas mãos calejadas e exploradas da nossa gente, seguiam em frente, alargando mais e mais esse rio humano, caudaloso, que explodia de solidariedade, na luta por mais emprego, melhores salários, melhor saúde e educação. Afinal a malta luta por tão pouco, apenas pelas coisas elementares para se levar um vida condigna. A malta não quer Jaguares, nem Mercedes, nem casas enormes e faustosas, nem férias nos melhores hotéis, nem viagens no espaço… apenas um cantinho, trabalho, melhores salários e reformas, saúde e educação… para todos. Apenas isso. Do outro lado, estavam "os outros". Uma vintena que manda, guardada por centenas de polícias, a decidir sobre a forma como iriam repartir o poder entre eles. E, vê bem Adriano, no dia seguinte, os grandes órgãos da comunicação social, claramente submetidos ao poder económico e manietados pelo poder politico já só falavam do dito tratado de Lisboa. Que era um tratado histórico. Um tratado fundamental e essencial para a Europa… e outras coisas semelhantes. Tudo palavreado… conversa de circunstancia… quais conversas de família. Pois então a malta pergunta : O tratado vai acabar com a chaga do desemprego? Vai aumentar os salários? Vai extinguir a lista de espera nos hospitais? Vai promover e melhorar a acção social escolar? Vai diminuir os preços e os impostos?  Sobretudos para os mais desfavorecidos? Vai baixar a taxa de juro para que os jovens possam cimentar raízes e estabilizar as suas vidas? Vai abater o endividamento familiar? NÃO VAI. Só vai dar mais um deputado a … criar um advogado permanente para… aumentar para 2 anos e meio o… . Ou seja, coisas que para os milhões de trabalhadores europeus e portugueses nada dizem. Ainda por cima querem ratificar o dito cujo sem referendo. PS, PPD/PSD e CDS estão com o tratado mas mesmo assim têm medo do referendo. MEDO que o povo, os trabalhadores digam NÃO. Digam não a esta Europa que continua a funcionar na base da exploração do homem e sustenta, suporta e alimenta as condições indignas de pobreza em que vive ainda parte significativa da população. O teu partido, Adriano, o PCP, é coerentemente contra o tratado e pelo referendo. O Povo é quem mais ordena. O teu PCP esteve deste lado, na maior manifestação de sempre dos últimos 20 anos. Ao lado do povo e dos trabalhadores, como sempre. Por isso a malta cantou a tua trova, Adriano :« Há sempre alguém que resiste / Há sempre alguém que diz não.». Fomos mais de 200 mil no dia 18 de Outubro em Lisboa. Mas somos muitos mais ainda os que resistimos. Em Portugal, na Europa e no Mundo. E assim também cantamos

     «               … para ti Lisboa à tua espera

     Teu nome escrito com ternura sobre as águas

     E o teu retrato em cada rua onde não passas

     Trazendo no sorriso a flor do mês de Maio.»

Naquela espantosa manifestação, no meio do povo, entre punhos e bandeiras levantadas, entrevimos a frase " Adriano Presente ".

Atanagildo Lobo

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