Edição 514
CRÓNICA: Triunvirato da vassalagem
Por estes dias, o povo português anda um pouco confuso com a sua noção de geografia. Sabendo-se periférico e do sul da Europa, até parece que pertence à Europa central tal têm sido as posições dos seus governantes. Apostados em transformar o nosso país num país modelo, com boa imagem externa e com prestígio internacional, a retórica da coligação que nos governa tem por objectivo transformar cada português numa mascote, daquelas em porta-chaves capaz de se entregar aos governantes da União Europeia, de preferência aos do sul da Europa. Já estou a imaginar certos ministros do ECOFIN a entregar alguns destes porta-chaves ao mesmo tempo que dizem: “que fofos e submissos são os portugueses. Até já comem na mesa do patrão!”
Numa altura em que se fala muito em desígnio nacional, o nosso triunvirato composto por Cavaco Silva, Passos Coelho e Maria Luís Albuquerque parece apostado em tornar Portugal num país obediente, submisso, graxista e um “exemplo” para mostrar aos mais traquinas.
Cavaco Silva está apostado no papel do coitadinho que gastou as últimas poupanças para emprestar ao vizinho gastador e irresponsável. Muito gostou Cavaco Silva de declarar que Portugal emprestou mil e 100 milhões à Grécia. O nosso presidente merceeiro prefere falar destes milhões em vez dos milhões de gregos que vivem abaixo do limiar da pobreza (muitos já sem acesso a pilares civilizacionais básicos como saúde ou electricidade) só porque… ainda ninguém encontrou uma razão histórica que justifique a queda de um país num abismo que só encontramos em tempos de guerra.
Pedro Passo Coelho, por seu turno, decidiu adoptar o papel de mesquinho ao declarar que Portugal foi o país que mais ajudou a Grécia em termos relativos. Para além de falso, rapidamente se pode observar o espírito do nosso governo nas difíceis negociações que decorreram no Eurogrupo. Talvez Portugal agora consiga ajudar com o encaixe do pagamento da dívida de Passos à Segurança Social.
Por fim, mas não menos importante, temos a nossa ministra das finanças que mais parece uma beata do templo sagrado da austeridade. A sua postura na mesa das negociações (agora numa pareceria ibérica) mostra uma disciplina de capataz, tendo uma atitude somente de defesa dos mandamentos da seita liderada por Merkel e Schäuble. Esta gente só tem uma preocupação: mostrar que o caminho da austeridade é o caminho da salvação.
Por mim digo que se lixe a retórica dos contribuintes europeus, a dívida pública ou o défice. Nada, como disse, justifica lançar um país no abismo.
(Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico)
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