Edição 472
A indústria moageira da Trofa em livro
Depois de publicar o estudo sobre os sistemas pré-industriais ribeirinhos, José Manuel Cunha descobriu que muito havia a descortinar sobre a indústria moageira no concelho da Trofa. A curiosidade fê-lo prosseguir o trabalho de investigação, cujo resultado foi publicado em livro, com o apoio da ADAPTA (Associação de Defesa do Ambiente e Património da Trofa), no sábado, 3 de maio.
A Azenha do Portela, em Bairros, Santiago de Bougado, foi o pano de fundo escolhido para o lançamento do livro “A Indústria Moageira no Concelho da Trofa”, de José Manuel Cunha, que não escondeu a mágoa pela falta de apoio. “O trabalho que apresentamos hoje (sábado) foi concluído em 2008 e agora foi publicado. Nunca houve por parte de ninguém, nem da Câmara, vontade de dar conclusão ao trabalho nem de defender o nosso património”, afirmou em declarações ao NT.
O autor afirmou ainda que o objetivo era “publicar” o estudo “na internet” para que estivesse “acessível a toda a gente”, incluindo “em cada um dos pontos do mapa a ficha técnica” dos sistemas moageiros, mas a ideia “morreu na praia”, porque “da parte da Câmara não houve continuidade do trabalho”.
Agora, José Manuel Cunha é “pessimista” quanto à concretização desse desígnio, manifestando falta de “esperança”.
O segundo livro do trofense traça, no que respeita ao objeto de estudo, a ligação “entre o primitivo e o atual”, referiu. Já Manuel Silva, que apresentou a obra, referiu que nela é possível perceber que existiram sistemas de moagem anteriores ao tempo dos moinhos e azenhas, em período mais recuado do Neolítico e da ocupação romana, cuja civilização terá adaptado dos gregos o moinho. “Bem documentados” estão moinhos hidráulicos do “século VI e VII”, anteriores às azenhas, introduzidas pelos árabes, que eram “bons na técnica da utilização da água”.
José Manuel Cunha dá a conhecer os sistemas de moagem ligados a uma das necessidades mais básicas do Homem, a alimentação, contextualizando-os ao longo da História.
Apesar de no século XVIII, os moinhos e azenhas funcionarem “com toda a pujança”, já revelando falta de capacidade para responder à procura, passado um século, a luta com os sistemas industriais, como os moinhos acionados por máquinas a vapor, tornou-se desigual. São divulgados dados e fotografias de duas moagens industriais, mais recentes, a Fábrica Industrial da Trofa e a Fábrica Industrial Alimentar Trofense. A aposta nos sistemas produtivos, desde a limpeza do cereal até à farinha, “veio dar a machadada final aos sistemas pré-industriais que existiam”, graças à “tecnologia importada da Europa Central”, afirmou Manuel Silva, na apresentação.
A evolução industrial não foi a única razão para o desaparecimento dos equipamentos tradicionais: as condições meteorológicas, mais concretamente as cheias do Rio Ave, em 1962, fizeram com que grande parte das azenhas nunca mais funcionasse.
No livro, José Manuel Cunha exulta o património arqueológico “riquíssimo” da Trofa e manifesta o desejo de “inverter o sentido da história”, defendendo “a necessidade da preservação da memória, importante para o reforço da identidade”. “Há um arqueólogo fora do concelho que consegue interpretar muito desse património e está esquecido, pura e simplesmente”, sublinhou o autor, que acrescentou que para dar continuidade a este projeto “era imperioso aprofundar todos os elementos” que disponibiliza no livro “e travar a paulatina destruição por paulatina incúria humana”.
José Manuel Cunha defende ainda a “procura de um caminho de maior sustentabilidade ambiental”.
A ADAPTA decidiu apoiar o lançamento deste livro por sentir “obrigação” de contribuir para “a preservação deste património”. “Estou na azenha, os meus filhos também, mas não sei se os meus netos vão estar. O nosso interesse é delegar o património que ainda resta para futuras gerações. Era bastante interessante que os responsáveis autárquicos e outros que existam pudessem ajudar-nos nesta preservação”, concluiu.
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