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Edição 469

O 24 e o 26

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Ricardo Garcia

Ricardo-Garcia

Há meia dúzia de anos, numa fila de espera no banco, ouvi uma conversa entre dois senhores sobre um caso relacionado com um crime e respetivas conclusões sobre a situação do nível de criminalidade em Portugal.

Entretanto, o interlocutor mais velho acabou por dizer: “isto no dia 24 é que era seguro. Podia andar de bicicleta de madrugada para qualquer lado que não tinha medo de ser assaltado.” Para os mais desatentos, o dia 24 de Abril, coitado, é o dia que simboliza para os reacionários o regime fascista e o “antigamente é que era bom”. Ao olhar para a personagem da bicicleta, um senhor já com mais de 70 anos pensei: “estivesse o senhor ainda no dia 24, e tendo em conta a esperança média de vida durante o Estado Novo, a probabilidade do senhor estar aqui era muito reduzida. Ainda mais reduzida era a possibilidade de saber que tal crime tinha acontecido, pois o lápis azul não gostava muito de ver notícias sobre criminalidade caseira. O lápis azul era mais de ação. Gostava ele próprio de ser o criminoso.”

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Nestas últimas semanas, duas personagens da vida pública portuguesa deram entrevistas a resvalar para o 24: Isabel Jonet e Alexandre Soares dos Santos. A primeira já tinha opinado sobre a quantidade de bifes que os portugueses comem e a relação com a crise (já agora, segundo o INE, os portugueses estão a comer menos carne, peixe e fruta), veio agora desabafar que as redes sociais são ópio dos desempregados e que estes estão agarrados ao computador a viver uma vida de ilusão. Bom era estarem envolvidos em acções de voluntariado para aumentarem as possibilidades de obterem um emprego. Bom era trabalharem de borla até que uma alma caridosa desse uma esmola. O último veio agora insurgir-se contra a lei da greve, segundo ele “imposta pelo Conselho da Revolução e antiquada”. Greve sim, mas com respeitinho. Esta malta nunca vai perdoar o 25 de Abril.

Por estes dias, vários órgãos de comunicação social têm dado especial atenção às comemorações dos 40 anos do 25 de Abril. A maioria dos artigos que tenho visto têm o registo Baptista-Bastos “Onde é que você estava no 25 de Abril?”. Através de alguns testemunhos que tenho lido, o 25 foi uma maçada e gostam é do 26. Para estes, o 25 era desnecessário, pois o regime acabaria por cair e existiria uma transição inevitável para a democracia, tipo “à espanhola”. Em História, aprende-se a não usar o “se” e cada regime tinha as sua vicissitudes. Aliás, muitos só destacam na Revolução dos Cravos a liberdade de expressão, deixando de lado conquistas reais e revolucionárias como a educação ou a saúde.

Por fim, ainda há quem use aspas no fascismo e queira a todo o custo abastardar a Constituição.

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