Ano 2011
Juntas de Freguesia: repensar ou acabar?
O espaço territorial português está a necessitar, provavelmente, de uma nova redefinição dos seus limites e estruturas pois mantém-se quase inalterável, há quase dois séculos, nas suas fronteiras nacionais e regionais. A divisão administrativa contém situações anacrónicas como a existência de muitos Municípios com escassa população mas com poderes e meios financeiros significativos. Em contraste, a existência de muitas Freguesias, que chegam a ter dimensões descomunais, em termos populacionais, mas com reduzidas competências reais e parcos recursos financeiros.
A estrutura administrativa, que o país tem, é muito complexa; a sua base é composta por 308 Municípios (mais o Município de Olivença que desde 1801 se encontra sob administração espanhola), que se subdividem em 4251 Freguesias. Durante muito tempo, as Freguesias tiveram apenas um papel religioso: eram circunscrições da Igreja, para fins de administração eclesiástica, e só com o século XIX, depois da Revolução Liberal, é que começaram a ser atribuídas algumas funções civis à Freguesia. Durante o século XIX, o poder político hesitou muito sobre se devia ou não reconhecer um papel, na administração pública civil, à Freguesia.
As Juntas de Freguesias foram criadas em 1830, como as mais pequenas unidades de administração pública. Mas, é na Primeira República, que as paróquias civis são designadas por Juntas de Freguesia; deixam de ter competências de carácter religioso. As suas novas funções são de carácter civil: administração dos bens paroquiais móveis e imóveis, elaborar posturas do âmbito da Freguesia. Já no Estado Novo, em 1936, é conferido as bases das Juntas de Freguesia, que são classificados em urbanas e rurais, de 1ª, 2ª ou 3ª ordem. E a Freguesia só se consolida no sistema português de autarquias locais, a partir de 1978.
As transformações verificadas depois do 25 de abril, criaram as condições para que as autarquias readquirissem a importância perdida e a possibilidade de se tornarem espaços de poder em liberdade e em participação. O Poder Local viu as suas competências acrescidas e o seu fortalecimento associou-se à democratização do País. De então para cá, nunca mais foi posta em causa as Juntas de Freguesia, e com algumas variantes, foram-se mantendo como autarquias locais. Já, no início da segunda década do século XXI, começa a ser questionada a sua existência em virtude da situação de grave crise económica e financeira que o País está a viver.
A Freguesia, tal como a conhecemos hoje, é uma certa originalidade do sistema administrativo português. Na maior parte dos Países democráticos ocidentais, não existem freguesias como aquelas que Portugal tem. A não ser em certas zonas rurais de Inglaterra, na maioria dos países da UE não há Freguesias, o que existe são Municípios grandes e Municípios pequenos.
As Freguesias para além de serem elementos constitutivos da democracia e da cidadania portuguesa, dispõem de atribuições nos seguintes domínios: Equipamento rural e urbano; Abastecimento público; Educação; Cultura, tempos livres e desporto; Cuidados primários de saúde; Ação social; Proteção civil; Ambiente e salubridade; Desenvolvimento; Ordenamento urbano e rural; Proteção da comunidade, salvo as localizadas nas redes viárias regional e nacional; Licenciamento de áreas de serviço que se pretenda instalar na rede viária municipal; Emissão de parecer sobre a localização de áreas de construção.
Tudo muito lindo, tudo quase perfeito. Mas, será que os meios financeiros colocados à disposição das Juntas de Freguesia são suficientes para as atribuições que a lei lhes confere? Claro que não! Deveria ser do domínio comum, mas não é, que financeiramente só têm capacidade para a prossecução dos poderes que realmente possuem: passar atestados de residência e de agregado familiar; gerir o cemitério; gerir o processo eleitoral e passar a licença de canídeos. É esta a triste realidade, daquilo que o poder apelida de “política de proximidade”.
Nestes tempos conturbados, de grave crise económica e financeira com que o país se depara, uma boa governação com uma sensata racionalização de meios é uma exigência que deverá ser feita pelos portugueses ao poder político. A necessidade de uma boa gestão dos bens públicos, aponta para a urgência de uma verdadeira reforma administrativa do país, que deverá ponderar sempre as características próprias inconfundíveis das nossas gentes, que se foram afirmando ao longo dos 900 anos de história.
José Maria Moreira da Silva
www.moreiradasilva.pt
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